terça-feira, 2 de junho de 2009

Modos de Narrar

Há dois modos básicos de narrar: ou o narrador introduz-se no discurso, produzindo-o, então, em primeira pessoa, ou ausenta-se dele, criando um discurso em terceira pessoa. Narrar em terceira pessoa ou em primeira são os dois pontos de vista fundamentais do narrador.

NARRADOR EM TERCEIRA PESSOA: ONISCIENTE e OBSERVADOR

Nesse caso, o narrador pode assumir duas posições diante do que narra:

1) Ele conhece tudo, até os pensamentos e sentimentos dos personagens. Comenta, analisa e critica tudo. É como se pairasse acima dos acontecimentos e tudo visse. É chamado narrador ONISCIENTE (que tudo sabe).

“A meia rua, acudiu à memória de Rubião a farmácia, voltou para trás, subindo contra o vento, que lhe dava de cara; mas ao fim de vinte passos, varreu-se-lhe a idéia da cabeça; adeus. Farmácia! Adeus, pouso! Já não se lembrava do motivo que o fizera mudar de rumo, e desceu outra vez, e o cão atrás, sem entender nem fugir, um e outro alagados, confusos, ao som da trovoada rija e contínua”. (Quincas Borba, Machado de Assis)

2) O narrador também conhece os fatos, mas não invade o interior dos personagens para comentar seu comportamento, intenções e sentimentos. Essa posição cria um efeito de sentido de objetividade ou de neutralidade. É como se a história se narrasse sozinha. O narrador pode ser chamado OBSERVADOR.

NARRADOR EM PRIMEIRA PESSOA: “EU” PROTAGONISTA e “EU” TESTEMUNHA

Nesse caso, ele está presente na narrativa. Pode ser o personagem principal ou um personagem secundário.

1) Quando é personagem principal, não tem ele acesso aos sentimentos, pensamentos e intenções dos outros personagens, mas pode, como ninguém, relatar suas percepções, seus sentimentos e pensamentos. É a forma ideal de explorar o interior de um personagem. É o que ocorre em O Ateneu, de Raul Pompéia, em que o personagem principal, Sérgio, narra, em primeira pessoa, as experiências vividas durante os anos em que estudou interno no colégio Ateneu. Observe, por exemplo, o texto abaixo:

“Vais encontrar o mundo, disse-me meu pai, à porta do Ateneu. Coragem para a luta. ‘Bastante experimentei a verdade deste aviso, que me despia, num gesto, das ilusões de criança’ (...)

2) Quando o narrador é um personagem secundário, observa de dentro os acontecimentos. Afinal, viveu os fatos relatados. O narrador conta o que viu ou ouviu e até mesmo se serve de cartas ou documentos que obteve. Não consegue saber o que se passa na cabeça dos outros. Pode apenas inferir, lançar hipóteses. O narrador pode ou não comentar os acontecimentos.

O modo de narrar em primeira pessoa cria um efeito de subjetividade maior que o modo em terceira pessoa. Este produz um efeito de sentido de objetividade, pois o narrador não está envolvido co os acontecimentos.

A IMAGEM DO LEITOR

O narrador pode projetar uma imagem do leitor dentro da obra e dialogar com esse “leitor”, prevendo suas reações. Esse leitor instalado no texto não se confunde com o leitor real. Observe como isso ocorre no próprio Quincas Borba, de Machado de Assis:

“Lá haverá leitor a quem só isso não bastasse. Naturalmente, queria toda a análise da operação mental do nosso homem, sem advertir que, para tanto, não chegariam as cinco folhas de papel de Fielding”. (cap. CXIII)

Platão & Fiorin. Para Entender o Texto. P. 138-139

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